Antônia era uma capivara de espírito vibrante, mas nos últimos dias, sentia um silêncio estranho pairando sobre Aqua-Serena. Aqua-Serena era uma cidade flutuante, um mosaico de plataformas interligadas por pontes de cipós tecnológicos, que flutuavam sobre um rio colossal no coração da Amazônia. Ali, edifícios redondos e jardins suspensos coexistiam em harmonia perfeita com a natureza exuberante. Normalmente, a cidade pulsava com risadas, o canto dos pássaros e o burburinho alegre de seus habitantes. Mas agora, um véu de melancolia parecia cobrir tudo.
Até o Professor Expedito, um tamanduá-bandeira idoso e o inventor mais brilhante de Aqua-Serena, parecia mais cabisbaixo. Seus laboratórios, antes cheios de barulhos curiosos, estavam quietos. Antônia, com seus olhos curiosos, observava. Ela notou que as folhas das Vitórias-Régias gigantes, que serviam de plataformas de pouso para as pequenas aeronaves solares, estavam um pouco murchas, e até as luzes bioluminescentes das algas marinhas pareciam mais fracas.
Decidida a descobrir o que estava acontecendo, Antônia procurou o Professor Expedito. Ele estava sentado em sua varanda, olhando para o rio com um semblante pensativo.
Antônia: Professor Expedito, o que está acontecendo? Aqua-Serena parece… triste.
Professor Expedito: Ah, Antônia, minha querida. Você também notou? Há semanas sinto essa névoa em meu coração. Meus sensores de humor coletivo estão em baixa recorde.
Antônia descreveu os pequenos seres translúcidos que vira flutuando perto das áreas mais afetadas. O Professor Expedito se animou um pouco, seus olhos ganhando um brilho de curiosidade.
Professor Expedito: Pequenas nuvens cintilantes, você diz? Com uma coloração azulada, talvez?
Antônia: Sim! Elas parecem sugar a luz de alguma forma.
O Professor Expedito gesticulou para Antônia o seguir até seu laboratório. No centro do laboratório, havia um mapa holográfico de Aqua-Serena, mostrando pontos de energia e emoções. Vários pontos azuis, indicando tristeza, estavam se expandindo.
Professor Expedito: São os Pingos de Sentimento, Antônia! Eu os descobri há algum tempo. São seres energéticos que flutuam na atmosfera, naturalmente atraídos por emoções fortes. Eles as coletam, as processam e as liberam, ajudando a equilibrar o ecossistema emocional. Mas algo saiu do controle. Eles estão absorvendo tristeza em excesso, sem conseguir liberá-la como deveriam. Isso está criando um ciclo vicioso de melancolia.
Antônia: Então, eles estão sugando a alegria de Aqua-Serena?
Professor Expedito: Inadvertidamente, sim. Precisamos ensiná-los a coletar e liberar alegria novamente. Mas como?
Antônia pensou por um momento. Ela se lembrou de como o riso de um grupo de crianças brincando sempre espantava as nuvens escuras, e como o som de uma canção alegre fazia as flores se abrirem.
Antônia: E se os alimentássemos com alegria, Professor? E se mostrássemos a eles o que a felicidade parece, soa e sente?
Professor Expedito: Excelente ideia, Antônia! Mas como faremos isso em grande escala? Precisamos de um amplificador de alegria!
Juntos, eles trabalharam incansavelmente. O Professor Expedito projetou um dispositivo que ele chamou de Harmonizador de Emoções, uma espécie de antena parabólica que podia captar e amplificar vibrações positivas. Antônia, por sua vez, organizou a comunidade. Ela convocou todos os moradores de Aqua-Serena – os tucanos que trabalhavam nos transportes aéreos, as lontras-gigantes pescadoras, os macacos-prego construtores – para uma Festa da União.
A festa aconteceu na praça central de Aqua-Serena. Havia música suave tocada por instrumentos feitos de bambu e folhas, danças leves, e, o mais importante, muitas conversas e risadas compartilhadas. As crianças contavam piadas, os adultos trocavam histórias engraçadas, e a alegria começou a florescer no ar. O Harmonizador de Emoções do Professor Expedito foi ativado, captando cada sorriso, cada gargalhada e cada momento de companheirismo, e os projetando suavemente para os Pingos de Sentimento.
Aos poucos, os pequenos seres azuis começaram a mudar de cor, adquirindo tons mais claros, esverdeados e amarelados. Eles flutuavam de forma mais leve, e onde quer que passavam, as folhas murchas se erguiam, as flores desabrochavam e as luzes bioluminescentes brilhavam mais intensamente. A tristeza, aos poucos, foi se dissipando, substituída por uma sensação de paz e um calor suave que abraçou a cidade.
Antônia e Professor Expedito observaram, felizes. Os Pingos de Sentimento haviam aprendido. Eles ainda coletavam emoções, mas agora sabiam como equilibrar a balança, transformando a tristeza passageira em oportunidades para a alegria brotar. Aqua-Serena voltou a ser a cidade vibrante de antes, mas com uma nova consciência: a de que mesmo nos momentos de tristeza, a união e a partilha da alegria podem iluminar o caminho e transformar o azul mais profundo em um brilho dourado de esperança.
